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Cid Benjamin

É bom abrir o olho.

teatro rio de janeiro

Nos anos 70, na ditadura militar, um preso político foi retirado da solitária em que estava, vestido com roupas de outros presos, pois ele já não tinha mais as suas, e levado à presença do juiz da 1ª Auditoria Militar. Ele tinha estado 20 dias incomunicável no DOI-Codi, o principal centro de torturas do Rio de Janeiro.

Aproveitou para denunciar as torturas sofridas, descrevendo-as em detalhes, apesar do claro constrangimento do juiz e do mal-estar causado entre os militares presentes - tanto um, como outros, cúmplices do que acontecia.

Afirmou ter inúmeras marcas de golpes com pedaços de madeira e cassetete, além de queimaduras em consequência de choques elétricos fortes e prolongados, em que os fios eram amarrados a partes do corpo, em particular aos órgãos genitais.

Em seguida, seu advogado, com quem o preso não tinha tido a oportunidade de conversar antes, solicitou à corte exame de corpo de delito, para confirmar ou não as denúncias feitas.

O Ministério Público protestou contra a possibilidade de exame, afirmando que o preso tinha reagido à prisão e lutado com os agentes da repressão. Assim, as marcas poderiam ter sido resultantes da briga. Mesmo que, por evidente, queimaduras nos órgãos genitais não pudessem ter sido resultado dela.

Por cinco votos a zero (quatro oficiais do exército e um juiz togado compunham a corte), foi negado o pedido. Em seguida, como o preso tinha também advertido que voltaria a ser torturado como represália por aquelas denúncias, o advogado pediu a suspensão de sua incomunicabilidade.

De novo, perdeu por cinco a zero e o preso voltou para o DOI-Codi, sempre incomunicável.

Pois bem, as coisas ainda estão longe disso no Brasil, mas, do jeito que vai o nosso Judiciário, daqui a pouco ele pode estar de novo acobertando qualquer tipo de coisa.

É bom abrir o olho.



PS - O preso era eu.




 

Cid nos anos 1960 e 1970, militou na luta armada, dentro do MR-8. Junto com os também jornalistas Franklin Martins e Fernando Gabeira, entre outros, participou do seqüestro do embaixador estadunidense Charles Burke Elbrick, em 1969. A operação teria sido motivada pelo desejo de libertar Vladimir Palmeira. Depois preso, foi exilado e morou na Argélia e na Suécia. Ao retornar, trabalhou nos mais importantes jornais do país, como O Globo e Jornal do Brasil e recebeu o Prêmio Esso de Jornalismo, com mais quatro colegas, por uma série de reportagens sobre a Guerrilha do Araguaia.

Atualmente é professor de "Realidade Sócio-Econômica e Política" nas Faculdades Integradas Helio Alonso - no Rio de Janeiro.

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